9.30.2014

Stalking



Colher silenciosamente qualquer ersatz de você. Fotografias. Palavras. Deslocamentos. É o que tenho feito há muito tempo. Por trás dos biombos, de óculos escuros, devoro com os olhos o que fez, com quem esteve, por onde andou. Leio tudo o que escreve, consentindo sobre seu modo  de lidar com as coisas. Aprovo suas opiniões como se fossem as minhas; se eu também as tivesse. Eu não sei ser eu, eu só, eu só sei ser contigo. Então me lembro: nem tudo. Nem tudo eu já aprovei. Houve aquela vez, quando você atualizou aquele status...bem, melhor não lembrar. Passei uma semana chorando, resolvi não sair de casa, não comparecer ao mundo. Por isso não quero mais recordar isso. É bom colocar de volta ao coração apenas o que importa, o que eu quero dotar de significado. Como suas andanças pelo mundo ou pelos arredores. Eu acompanhei cada deambulação de sua viagem à Costa Rica. Os lugares que marcou no Foursquare, as paisagens que postou no Instagram, os novos amigos que adicionou ao Facebook. Aliás, eu coleciono as fotos daquelas suas férias, como se fossem meu próprio álbum. Você parecia tão feliz. Uma delas em especial, um selfie no qual você tem um sorriso de orelha a orelha, eu imprimi e carrego comigo na carteira. Nos dias em que estou triste (triste de doer), contemplo aquela fotografia como a um santinho. É meu escapulário contra a dor de viver. Para os outros momentos, a fim de me dar um presente, vejo todas as outras fotos suas que salvei no smartphone. No meu notebook também tenho imagens, até mesmo as daquela sua conta do Fotolog que você fechou faz muito tempo e eram (na sua ingenuidade?) bem mais ousadas. Bem, essas fotos se prestam a outra coisa, não muito românticas, mas ainda assim cheias de desejo. Acompanhar seu mundo, às escondidas, como um puro e tecnológico amor platônico, tem sido minha razão de viver. É o que me deixa alegre e com forças para levantar da cama. E saber de você estabelece uma comunhão de almas. Sei quando está feliz porque não para de ouvir a mesma música no Last.fm. (Comportamento que eu acabo repetindo quase inconscientemente). Sei quando está estudando porque não vejo você na web. Descobri seu número e endereço na lista telefônica. Vez em quando eu ligo, de telefones públicos diferentes, só para ouvir sua voz e você não ouvir a minha pelo bocal abafado. Às vezes, não me aguentando de saudades do seu cheiro, vou até sua casa e espero sua hora de ir à academia, de passear com o cachorro, de ir à faculdade...Tenho sorte de amar alguém com padrões de comportamento e horários regulares. Nessas pequenas emboscadas, basta atravessar a rua, seguir seu corpo à distância e sentir o rastro de seu perfume. Se eu não soubesse tanto sobre você...mas sei...e sabendo....nem preciso de muitas outras informações para saber onde vai. Pelo perfume que escolhe, tenho ideia de onde pretende ir. E onde vai. Chego a me assustar quando, por um acaso, quase uma catástrofe, seus olhos cruzam com os meus. Será que você se lembra de mim? Já me viu antes? Será que sabe que eu existo? Um dia, quem sabe. Um dia você vai saber. Eu vou contar, ah, eu vou contar.

.: marcio markendorf

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