4.19.2009

carta em caixa

Hopper,
quero abrir a caixa pedaço por pedaço. quero fazer dela um mundo novo, uma pós-pandora enternecida, viva, quente, cativante. quero descobri-la com meu toque, com minha fome, com minha vontade e acho que estou perto disso. chegou há duas semanas a caixa que você mandou de sua viagem pelo Egito (creio Egito, pelos hieróglifos que contornam a base). Henry achou estranho que o embrulho não tivesse selo e foi por isso que me entregou sem abrir antes (a falta de selo me salvou! até quando?). ele continua achando que Ana já disse tudo e que minhas investidas literárias são piegas e pouco atuais. shock! precisei de uns dias para voltar a minhas idéias de livros e da editora na qual nos vejo trabalhando daqui uns 30 anos. my dream, my dream. sim, continuo lendo as correspondências de Ana, mas queria mais ler os poemas dela, as ficções (vivo na confusão de não saber como ler as cartas dela, às vezes parece que não escreveu para mim). estou fazendo roteiro de vídeo, pensando em como fazer sobreviver um pouco da arte que posso fazer. as leituras, god! estou com tudo atrasado e lendo cada coisa de virar os miolos, chego a ter overdose de conceitos. você deve me achar crasy de entrar naquela aula da pós, com aquele professor crânio e aquele povo babando em volta, mas eu quero é pensar e não boio tanto quanto você imagina, já leio filosofia a um tempo. de resto tô com saudades de todo mundo daí do outro lado do mundo. soube do jesse? ele sempre me vem a mente. desisti da psicanálise de vez, não é pra mim. mas tô lendo sobre Lacan com Hegel, e descobrindo que o pirado não sou eu, nem meus amigos. nem acho que você tá pirado em pintar alucinadamente as minhas cartas. acho que estou em lua-de-mel com Ana, até a hora que ela agüentar. a caixa é linda, tem um ar sisudo de coisa séria e complicada, mas é linda e combina comigo, com a minha mesa. já tô me vendo no chão tentando abri-la. vai ser difícil, mas acho que consigo. ah! lembrei de um filme em que eles abriam uma caixa-enigma com um sopro. acho que vou rolar dias com essa caixa, transar umas soluções loucas para desvendá-la. parece brinquedo, antigo, não sei. quase toda noite tenho o mesmo sonho, encontro palavras dentro dela. "quero descobri-la com meu toque, fazer do contato uma chave, da chave um frisson, possuir o dom de escancará-la a dois, a três, as quatro da madrugada. quero ter a caixa aberta, entregue, desvelada. soprar a poeira gasta", acha um começo muito explícito pra um conto?

Your evers,
E.

ps.: I'm Hopper too.

.: oberdan piantino
florianópolis, 19 de abril de 2009
(carta-experimento amplamente baseada nas correspondências de ana cristina césar
e em possibilidades ainda não trabalhadas das cartas de edward para hopper, imagem Hopper "boy and moon", sem data, aquarela e tinta da china).

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