5.20.2012

amores platônicos em sala de aula


desde que pousei meus olhos em ti já não posso dormir. as noites deixaram de ser tranquilas, tornaram-se fantasias insones que me atacam e me revolvem nos lençóis da cama, no tapete da sala, no parapeito da sacada. não durmo, mas sonho todos os dias.
assim:

luto contra todos os relógios da cidade, apresso meus passos, apresso os carros com o pensamento, tudo, tudo para chegar antes. e primeiro. escolher o lugar na sala. movimentar meu assento para trás do teu, depois aguardar tua entrada, esperar teu cheiro confirmar tua chegada, ver na tua nuca a prova viva da tua temporada diante de mim. então fecho os olhos, suspiro bem fundo, tragando o ar com mais gosto que um fumante, mais vontade que um viciado, só para me preencher desse teu cheiro de mato e alecrim amassado. em seguida, toco teus ombros distraídos de mim, digo um cumprimento qualquer, disfarçando minha vontade de gritar, de gemer, de implorar por um beijo aguado de bocas e bocas de eternos e infinitos amantes.

quando se vira, meus olhos pousam nos teus olhos com doçuras de borboleta. talvez note, talvez não. talvez eu não tenha trazido nas patas e nos cílios polén suficiente para fecundar este olhar. fazer florescer tua florada, fazer do teu olhar minha morada perpétua. e, quem sabe, fazer dos meus sonhos uma abelha-rainha; do teu pólen, a geleia real dos meus dias.

mal a aula começa, fico deambulando pela tua nuca, notando a penugem do pescoço, a espessura do teu dorso. fico ensaiando os dedos bem próximos do teu cabelo, fingindo carícias no ar, enroscando caracois nos nós dos meus dedos. imagino teu sono, tua vontade de dormir no meu colo. penetro os dedos bem fundo, toco o couro cabeludo, torno mais íntimo meu apelo. coro, quase choro.

pergunto qualquer coisa, finjo que me perdi na matéria. invento as mais ingênuas dificuldades para que me explique de novo, para que renove o ar com teu hálito, aquele que prenuncia o gosto das gengivas vermelhas, a sede dos corações em chamas na garganta.

e quanto mais o dia se aproxima do fim, mais quero desacelerar o tempo, vencer os relógios e atrasá-los por uma duração que nem sei. tudo para impedi-los de tomar para si as tardes inteiras e devolver em troca as longas noites de vigília. então, a despeito de toda luta contra o fuso horário, chega aquela parte do dia em que vejo tuas costas partindo, teu corpo dobrando a esquina, minha paixão desaguando em dois ou três dias de dilúvio.


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